
Infelizmente, muitos autores canadenses não conhecem no Brasil a recepção (e a admiração) obtida na Europa ou em terras de influência francesa. Chega a ser lamentável o fato de talentos como Anne Hebert, Louis Hémon e Nancy Huston serem completamente ignorados pelos leitores brasileiros. Talvez, a nossa tradicional falta de interesse por algo vindo de fora do eixo Londres-New York (ou pior, Miami-New York), explique a tragédia de nossa estreiteza geográfica. Se o mercado livreiro tupinambá não faz questão de formar um público com horizontes literários mais amplos, as maisons d´édition francesas não vacilam e põem a disposição da avidez literária francófona e francofílica nomes como Gaston Miron, Jacques Ferron e a soberba Antonine Maillet.
Nascida em 1929, na província de Nova Brunswick, Antonine Maillet pode ser considerada a voz de Acadie, antiga colônia francesa na América do Norte, palco, no seculo XVIII, de um dos momentos mais dramáticos vividos pelos franco-canadenses: o chamado "Grand Dérangement", evento terrível onde grande parte da população de língua francesa acadiana foi expulsa de suas terras pelos ingleses, vindo muitos a se instalarem, posteriormente, na Luisiana. Na apresentação à sua chef-d´oeuvre, "Pélagie-la-Charrette", publicação da Grasset, Maillet é mostrada como "la première à avoir donné de si belles lettres de noblesse à un peuple dont la mémoire écrite fut confisquée, ocultée par l´occupant anglais , et qui ne résista que par une très forte tradition orale". Oralidade esta conservada num francês que remonta à língua falada no século XVII, o século de Rabelais, figura estudada por Maillet em sua tese de doutorado "Rabelais et les Traditions Populaires en Acadie" e que delimita seu territoire d´écriture; palavras de Maillet: "J´ai trois siècles d´Amérique du Nord dans les veines... si je suis française, c´est par la langue du XVII siècle, et par Rabelais".
"Pélagie-la-Charrete" é uma obra que, pela dramaticidade urgente de seu estilo, lembra em muito ao "Suite Française" de Irène Némirovsky. Suas cores terrivelmente vívidas numa língua vestígio compõem um épico doloroso, mas nunca sem esperança. Uma epopéia americana tecida com paixão e maestria.
Pélagie-la-Charrete
Antonine Maillet
Grasset - Les Cahiers Rouges
de R$ 47,00
por R$ 35,25
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