segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

A Eloquência da Palavra


Livro de Anne Régent-Susini traz coletânea de prédicas religiosas de grandes nomes da espiritualidade cristã.

Talvez a maior herança deixada à fé cristã pelo judaismo tenha sido a centralidade da pregação nas celebrações cúlticas. Entendida como o ápice da reunião religiosa, a chamada proclamação da Palavra é o momento em que o púlpito suplanta a suntuosidade do altar e ao sacerdote é permitido ser, muito mais que uma mera figura administrativa do rito, a personificação da voz de Deus.

Se, na conturbada história das igrejas cristãs, assembléias piedosas tiveram os ouvidos tomados por vozes veludosas suplicantes por guerras e perseguição, muitas outras, apesar da rouquidão ou da timidez invencível de seus emissores, puderam ser elevadas às alturas celestes, diante de sublimes mensagens de fé e esperança, de respeito e amor ao próximo, de coragem para se estar na contramão das movimentações febris de reificação da vida.

Na reflexão suscitada sobre a "arte" de pregar, o conflito entre a retórica e o despojamento, sempre foi presente, marcando acaloradas discussões em torno do embate "brilhantismo intelectual vs. proclamação da verdade divina". Atenta a tudo isso, Anne Régent-Susini apresenta em "L´Éloquence de la Chaire" uma mostra significativa do que de melhor foi pregado nos púlpitos cristãos pela história.

Indo de nomes bastante conhecidos do grande público, tais como João Chrisóstomo e Martin Luther King Jr., até personalidades injustamente esquecidas, tais como o padre polonês Henryk Jankowski - figura de destacada militância pró-democracia na Polonia comunista dos anos 1980 - e Joseph Foliet, apóstolo engajado na luta pelos direitos sociais dos trabalhadores, durament atacado pela Action Française, Régent-Susini, maître de conférences na Sorbonne, faz de sua coletânea um elogio apaixonado do discurso litúrgico.

O leitor sensível verá o quanto palavras tão antigas, pronunciadas em contextos tão diferentes dos nossos dias de maluca urgência, parecem ter sido ditas diretamente à nós; em tempos de ajudas milionárias à instituições pouco afeitas à solidariedade, como bancos e seguradoras, a constatação do pregador medieval Jean Gerson ("On dépense plus d´argent à nourrir les chiens qu´à secourir les indigents") é de uma atualidade lancinante.

Com Régent-Susini vemos que um sermão pode ser tudo, menos ennuyeux. A epígrafe escolhida por ela para sua antologia (retirada de um trecho de uma carta de Madame de Sévigné à sua filha), não poderia ser melhor convite à um mergulho na eloquência da tribuna eclesial: "Ce sont des chefs-d´oeuvre d´éloquence qui charment l´esprit. Il ne faut point dire: Oh! cela est vieux; non, cela n´est point vieux, cela est divin."


L´Éloquence de la Chaire: Les Sermons de Saint-Augustin à nos Jours
Anne Régent-Susini
Seuil
de R$ 105,00
por R$ 73,50


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