sexta-feira, 14 de maio de 2010

Aliança Mundial contra as Desigualdades: Danielle Miterrand debate com Ladislau Dowbor e Bernardo Kliksberg em Conferência Internacional


Denise Ribeiro
Vinícius Carlos Vieira


Justiça social e econômica, o terceiro princípio da Carta da Terra, foi o tema de palestra que reuniu na Conferência Internacional 2010 do Instituto Ethos três debatedores comprometidos com a luta em favor dos menos favorecidos: o anfitrião Ladislau Dowbor, economista e professor de pós-graduação da PUC, a ex-primeira dama francesa Danielle Mitterrand, presidente da Fundação France Libertés, e o economista argentino Bernardo Kliksberg, principal assessor para a América Latina e o Caribe do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (Pnud).

Os três debatedores insistiram na premissa de que a ética deve ser a norteadora de um modelo econômico mais inclusivo e socialmente mais justo, que diminua o enorme fosso que separa os mais ricos dos mais pobres. “O centro do dilema é que 60% da população mundial consome menos de 6% de toda a riqueza produzida”, argumenta Dowbor. “Não é justo apenas uma minoria desfrutar o fruto do trabalho de todos”, frisa Danielle.

Ela pergunta se estamos prontos para reconhecer nossos erros e entender que é a Terra, nosso lar, a grande produtora de bens comuns. “O ar, a água, a terra, o fogo/sol, fonte de calor e energia, não são mercadorias. Estamos prontos a mudar nossa forma de produzir, a sair do domínio do dinheiro, visto como única fonte de poder e felicidade? Estamos prontos para construir um projeto de sociedade humana que responda à nossa busca da alegria de viver?”

No entender de Danielle, vivemos uma crise de democracia, porque os cidadãos, especialmente os jovens – os que mais renegam esses processos injustos e sem sentido – não se sentem ouvidos nem representados. “Somos todos culpados pela não assistência às vidas em perigo e pela transformação da água em commodity. Esse é um dos mais graves problemas a serem resolvidos: fazer com que os bens vitais sejam protegidos e acessíveis a todos”, exorta ela.

O acesso à água também foi apontado por Bernardo Kliksberg como um dos indicadores mais preocupantes da desigualdade. “O nível de consumo de água recomendado por habitante é de 20 litros por dia. Na Europa cada pessoa consome 200 litros ao dia, nos Estados Unidos, 400 litros. Enquanto isso, os mais pobres consomem 5 litros por dia de água contaminada”, afirma.

Os dados trazidos pelo economista argentino impressionam. “Metade dos leitos hospitalares do mundo está ocupada por vítimas de doenças decorrentes da água contaminada. Ela mata mais do que toda a violência e todas as guerras juntas”, alerta.

Kliksberg citou, ainda, outros indutores da pobreza e da injustiça social: a falta de acesso a alimentos e educação de qualidade, a discriminação de gênero – com destaque para o que chamou de “feminicídios” –, o trabalho infantil (uma em cada 100 crianças trabalham no mundo, 17 milhões), a mortalidade de mães, a falta de perspectiva de um futuro digno para os jovens. “Na América Latina, o continente mais desigual do mundo, a situação é de alto risco, pois um em cada cinco jovens está fora do sistema educacional – o que significa uma bomba-relógio social, pela quantidade de excluídos do mercado de trabalho”, explica.

Outros dois problemas dessa lista, que ele denomina de “escândalos éticos”, são as mudanças climáticas e a desigualdade de patrimônio. “Os mais pobres sofrem 80 vezes mais o efeito do aquecimento global. Os 10% mais ricos detêm 85% do capital mundial, enquanto os 50% mais pobres ficam com apenas 1%. E o pior é que permitimos tudo isso”, ressaltou.

Além de políticas públicas voltadas ao bem comum, as empresas têm papel importante no enfrentamento desses dilemas. “É preciso educar os líderes para a responsabilidade socioeconômica e romper o patamar da empresa narcisística – que só pensa no lucro imediato – e filantrópica. Os empresários, além de praticar a transparência, têm que se preocupar com a marginalidade e a diminuição da pobreza e da desigualdade”, defende ele. “Temos que reconstruir o planeta sobre bases de solidariedade e responsabilidade compartilhada”, conclui Kliksberg.

Livro de Kliksberg valoriza ser humano

O economista argentino Bernardo Kliksberg promoveu, logo após a palestra, o lançamento do seu livro “As Pessoas em Primeiro Lugar”, escrito em parceria com o Prêmio Nobel de Economia de 1998, o indiano Amartya Sen.

A obra, uma reunião de artigos e conferências da dupla de autores, nas palavras do próprio Kliksberg, acaba “não sendo apenas um punhado de denúncias”, mas, sim, propostas que tentam combater a desigualdade “como origem dos problemas centrais dos países em desenvolvimento”.
“Queremos dar voz aos excluídos e esquecidos” disse Kliksberg, enquanto uma pequena platéia esperava pelo autógrafo do autor, que completou: “É uma tentativa de trazer os invisíveis a público”. O livro pode ser encontrado no estande de vendas de livros durante a Conferência Ethos, que termina na sexta-feira, 14 de maio.


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