O que seria de nosso teatro ocidental contemporâneo sem o Oriente! O melhor da cena atual - o seu legado artístico para o amanhã - deve muito à Bali, à Zeami, à ópera chinesa. E deve muito à certos orientais vindos de uma Europa falante de línguas estranhas (em sua maioria grafadas em cirílico), marcada por uma imensidão de contrastes, verdadeiro caldeirão de signos. Gente como os fundadores do lendário Teatro de Arte de Moscou Stanislavski e Nemirovitch-Dantchenko, como Meyerhold, como Maria Knebel, como Mikhaïl Tchekhov, como Vassiliev, como Tadeuz Kantor, como Jerzy Grotowski. Este último, verdadeiro Noverre da era pós-industrial, deixou como herança aos amantes da arte teatral, além de seus escritos (e reescritos) e encenações, sua voz em registros antológicos.
De 1997 à 1998, o mestre polonês pronunciou em território francês diversas conferências (no Collège de France, no Théâtre des Bouffes du Nord, no Théâtre du Rond-Point), todas elas reagrupadas no coffret (2 CDs MP3) La Lignée Organique au Théâtre et dans le Rituel, dentro da coleção Aux Sources du Savoir, da célebre Le Livre qui parle. Estas aulas condensam de modo admirável toda a filosofia cênica de Grotowski.
Para o pensador a construção da cena se dá "na pele" do ator. Precedendo a palavra e, até mesmo o gesto, está a impulsão; é ela a matéria-prima essencial para o artesão dramático. Ignorar isto que Grotowski, servindo-se da língua inglesa, chama "push" é descaracterizar violentamente o teatro, reduzindo-o à uma mera recitação. O teatro é - ensina Grotowski - antes de mais nada, ritual, celebração do sagrado.
Ouvir o mestre não é fácil. Seu ensino, de uma delicadeza e sofisticação imperturbáveis, exige sensibilidades apuradas, polidas pelo estudo diligente, engajado, das ciências do palco. Mas não há como não ver, diante de nossa verborragia cênica hodierna, a urgente - vital, poderia-se dizer - necessidade do ensino de Grotovski. Ouçamos o mestre, portanto, com toda a atenção.
La Lignée Organique au Théâtre et dans le Rituel Jerzy Grotowski Le Livre qui parle
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